segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Entre o brilho e o desespero (trecho)

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- Às quatro no Hyde Park?
- Sim...na parte dos arbustos.
- Não sei se seria uma boa idéia...- Alice retruca
- Do que você realmente tem certeza nessa vida?

Alice tremia. Tremia, doia, brilhava. Era cisma. Estava tirando uma onda com sua cara. Ben era perfeito demais pra ser verdade. Era só um encontro no Hyde Park. E ela estava muito curiosa para o que Ben tinha a lhe dizer.

A fria Londres gelava todos os sentidos de qualquer um. Mas os dela não.Se sentia em pleno verão, primavera...Colocou seu sobretudo, os cabelos soltos cobrindo as orelhas. Às quatro. Ou seria algo muito importante. Ou algo muito gozador. O que o fantástico, sabe-tudo Ben, pianista clássico, de família tradicional londrina, queria com Alice, que passava boa parte do tempo lendo sobre Filosofia e enrolando band-aids em seus pés destruídos pelo ballet. Alice morava com o pai Joseph, e seu gato, Ken. E nada mudava. A vida era sempre a mesma.

Alice chega ao Hyde Park. Procura...Não acha. Tenta ter por referência os cabelos loiros soltos de Ben e seu indefectível casaco xadrez listrado verde e seu cachecol vermelho. Vê alguém deitado. Próximo aos arbustos, envolto em fumaça. Se aproxima lentamente...Estava de olhos fechados.

- Pensei que não viesse mais -disse Ben, levantando rápido, como se sentisse sua presença de forma sensorial, arrancando um grito de susto de Alice.

- Por Deus! Não faça mais isso! - disse Alice, e logo em seguida, Ben a abraça, jogando a na grama.
"O que? o que ele fez?"

- Ally...leve a vida menos a sério.

Ally deu um leve sorriso, tragando de seu cigarro e dando uma gargalhada que estava presa, mas não sabia se era de desespero ou de alegria.

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trecho de "Entre o brilho e o desespero" K. Falcão

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Meio-dia se foi.

E hoje acordei e vi que passavam do meio-dia.
Meio-dia.
Meio-dia se foi.
E fui eu que acabei com ele.
Quero dizer, meu sono profundo e sem fundamentos.
Tava acabado. Metade dele.
Não vi o sol nascer,
Não senti aquele frio de manhãs de primavera,
Não senti minhas bochechas rosadas e arderem
E nem minhas orelhas gelarem.
Apenas dormi.
Me afundei nas minhas fases soníferas.
Me afundei na realidade do sonho, do sono,
Dos travesseiros,
Vi que era mais cedo, despertador toca.
Não pensei nas risadas das crianças indo para a escola,
Não senti o cheiro de café,
Tampouco li as manchetes da banca de jornal.
Matei meio-dia.
E com tanto remorso.
O que poderia ter sido.
O que poderia ter feito.
Ficha na academia? Traças.
Há uns livros em minha cabeceira,
Alguns quilos perdidos, mas eu não os acho...
Vontade de tudo.
Vontade de mais.
Vontade do intenso.
Mas eu perdi meio-dia.
Já era.