sábado, 28 de abril de 2012

Aos insuportáveis assumidos, o meu respeito.


01:27 de sábado.
Não estou para boemias.
Acho que aceitei que nasci para parir, ser esposa e levar as crianças na escola. Embora ainda não tenha um marido, nem bebês, tampouco crianças na escola. Mas fantasio tomar chá enquanto o o marido lê o jornal ao lado, naquela cena bem clichê. Pseudo retrô - contemporânea.
A última coisa que tomei foi um sorvete, estou enrolada em um edredom antigo e sincero, e eu queria muito uma xícara de café agora. Porém, além da preguiça de sair do edredom-casulo e ir à cozinha, a xícara de café iria colocar os meus planos do sono chegar por água abaixo.
Sou uma mulher calejada. Não, não sou a "dolorida, a sofrida" de Florbela Espanca, mas a tolerância-limite, a bomba-relógio, o limite do equilíbrio e da esquizofrenia, tendendo a um comportamento bipolar, choro e riso repentino, pânico e alegria em frações de segundos. Insuportável, teimosa, desequilibrada, instigante, intragável, desafiadora, imprevisível, mas com certeza, o que eu mais aprecio é o insuportável.
Tudo aquilo que não suportamos, incomoda. Se incomoda, há alguma importância. Não que eu me preocupe em ser importante. Só me preocupo em me doar, doar meu melhor, meu tempo, minha habilidade, minha risada descontrolada, meu comportamento quase beirando ao infantil, minha maturidade forçada e imposta pela vida. Se eu serei importante, isso não é problema meu. Importância é algo que importa a nós mesmo. Literalmente. 
Mas confesso, o adjetivo insuportável é o mais irresistível e interessante. É aquilo em que você se preocupa em repelir. Em evitar. Em bloquear. Em não sentir o cheiro, a voz e o brilho. Que incomoda. Não que eu fique feliz em incomodar. Mas se eu incomodo, é por que sou importante. Incomode o padeiro que vende pão de bicicletas à tarde, incomode aquele amigo de sempre ou um amigo distante, seu irmão, sua tia, sua mãe. Produza sentimentos alheios. Não façamos da vida inércia. Não faça da vida alheia inércia. Implique, indague, questione, beije, abrace e faça valer a sua opinião ou mude sua opinião. Falar, chorar, ou até gritar educadamente valem... se houver respeito e intimidade suficiente, sim, mande um "eu tenho para mim que você é um completo otário por motivos tais". Ou você será insuportável ou um pouco amada.
Fale de saudades vis, fale de momentos vis, fale de tolices e de nostalgias. Fale do hoje, do amanhã, do futuro que já é amanhã ( ou hoje?). A vida é estrada, é estrada que os leva a caminhos tortos, que nos levam a avenidas desconhecidas ou não.
Não receiem serem insuportáveis. É um belo estilo de bem viver.
Bom o sono enfim está vindo após ministração medicamentosa dos bons sonhos.
Aos insuportáveis assumidos, o meu respeito.



segunda-feira, 16 de abril de 2012

Falsamente despedaçado

E meu caminho seguiu,
segue, segue seguindo,
mesmo com cercas e arames farpados,
seguiu e segue.

Mesmo que eu tenha o amaldiçoado inconscientemente,
mesmo que eu tenha o desacreditado,
o desesperançado,
o despedaçado.
Mesmo lembrando de duras lutas e dores,
mesmo sabendo que tudo pode desmoronar,
eu escolhi seguir, andar, viver, sentir.
meu caminho seguiu,
e segue.
Por quê mesmo toda a sede que passei,
e a desidratação causada por lágrimas,
naquele caminho parado, fechado para balanço,
esbarrei com um alguém.

Um alguém também que estava andando por uma alameda,
já havia me cumprimentado de forma lânguida e displicente,
sim, e muitas vezes.
neguei dar a mão a ele.

Pulamos juntos as cercas de arames farpados,
as mentiras plantadas através de dor,
e hoje seguimos nosso caminho,
nosso caminho segue,
seguiu, e segue seguindo.





segunda-feira, 2 de abril de 2012

Beleza aonde há beleza



Ouvi esses dias que as minhas fotografias mais bonitas são aquelas em que passei os melhores momentos de minha vida. Muitas eu estava deslumbrante, mas não tão bonita como uma simples foto tirada antes de dormir. Sem maquiagem, ou com o cabelo minunciosamente escovado ou com inúmeras poses - eram aquelas simples, singelas, displicentes e despretensiosas.
A beleza estava havia beleza. Eram nos melhores momentos de minha vida que apareciam as melhores fotografias. Rosto corado, saudável e com formas. Sorriso fácil e olhar tranquilo. A beleza existia por que existia beleza na minha visão de vida. Todas as vezes em que via um mundo feio, cruel e sem esperanças, meu rosto dava lugar à ossos, falta de viço e olhar vazio.
Aonde estava a beleza? Por mais que se usasse de artifícios de maquiagem, photoshop, a beleza não estava mesmo ali. O que enxergava era um mundo sem estimativas, uma vida sem motivos e nenhuma coragem para escalar, levantar e subir. Subir? Sumir.
Aonde está essa tal beleza? Beleza de ver simplicidade em qualquer coisa banal, de se sentir leve, de não ter medo de ser quem é, de não ter medo de sentir medo e de permitir errar e se destruir de vez e quando. E onde é esse belo, esse fascinante, esse inebriante, esse brilho que gruda e não sai?
Beleza aonde há beleza. O belo para ti pode ser qualquer coisa. Qualquer conversa jogada fora. Qualquer flor caída no chão. Qualquer gole de uma bebida amarga. Qualquer mergulho em uma paixão incerta/certa. Qualquer coisa tranquila. Barulho. Ócio. Banho quente. Cheiro de terra molhada. Sereno. Dormir sem hora para acordar. Acordar cedo e comprar a primeira fornada de pão. 
Ver beleza. Não só ver. Enxergar. Sentir. O que vale. O que realmente vale. O que vale seu sorriso, sua gargalhada, o seu brigar, o seu lutar.
Enxergue, queira, sinta, busque. Também pode estar no chamado feio. No descartado. No rejeitado, no prostituído, no desenganado, no sofrido. 
Quem têm olhos, que enxergue a beleza. E saiba o que é. Ela é leve. Lânguida. E de repente nem todos podem sentir.